26 de fevereiro de 2007

Criação associativa e os novos paradigmas do livro impresso.

“O novo é sempre uma extensão do velho” (Marshall Mc Luhan).

Essa afirmação de Mc Luhan é capaz de resumir muito bem a incrível capacidade humana de associar e ampliar sua cultura. Para explicar isso, primeiro temos que nos desfazer de algumas noções românticas que ainda se encontram entranhadas no imaginário popular, principalmente, naqueles países onde o Romantismo teve maior penetração cultural. Isso, com efeito, inclui tanto alguns países europeus de lingua neolatinas quanto os países latino-americanos que, por influência direta de seus colonizadores, herdaram também conceitos que já não podem ser concebidos como verdade na produção criativa cultural, a saber: questões como “gênio e genialidade”, “original e originalidade” e, até mesmo, a idéia de uma “criação Inspiradora divina”.

Essas palavras e conceitos, juntamente, com seu significado ideológico-religioso permearam todo o período romântico os quais formavam, paulatinamente, reflexos deturpados e; talvez, inaplicáveis nos dia hoje; numa sociedade moderna na qual o pensamento da maioria está voltado, quase sempre, para a produção e modificação das informações e da cultura, consequentemente. Desta forma, novos paradigmas sobre Criação e Criatividade são estabelecidos com conceito mais dinâmicos, mais humano e menos dogmático. Com isso, podemos dizer que todas as miraculosas feituras tecnológicas e científicas que o Homem desfruta hoje em dia vieram a partir de uma nova tomada de consciência de produção cultural.

Ao passo que isso vai se desenvolvendo, o mundo moderno toma impulso e ganha velocidade centrífuga, capaz de tragar tudo para dentro do seu eixo de “spinning”, ou seja, todos os elementos culturais que ainda não foram aplicados pela Convenção Social como ferramenta de desenvolvimento cultural, já são de certo modo figurados pelas mentes de cada época podendo, desta forma, servir como base para o surgimento de algo que se moldará às carências das pessoas em suas respectivas épocas históricas.

Portanto, é justamente por meio de associações que o Velho dá lugar ao Novo; porém, ao invés de desaparecer por completo, ele persiste por um certo tempo; alimentando aquilo que é Novo com suas formas de funcionamento até este ter criado habilidades próprias ate que forme sua própria linguagem.

Temos como exemplo disso: a fotografia que veio das artes plásticas, o cinema que veio tanto do teatro tradicional quanto da fotografia, a televisão que veio do rádio e, finalmente, a internet que veio basicamente das formas tradicionais de livros impressos.

Enfim, qualquer um desses novos meios não passou a existir simplesmente; eles mais do que terem sido inventados foram criados; como resultantes de associações que lhes possibilitaram progredir e se desenvolver para poderem se tornar algo maior e mais amplo. Mais uma vez, ao contrário do pensamento Romântico sobre Inspiração, muita Transpiração foi preciso para que o Novo surgisse, entretanto, mais importante do que seu surgimento, são as suas razões porque surgem.

Por isso, encontramos na própria Cultura as respostas de seu desenvolvimento, por exemplo, ao falarmos em conhecimento ou informação pensamos tradicionalmente em livros, isso não acontece por acaso, como a maioria de nós sabemos, a história do livro carrega consigo tanto a jornada humana em busca do conhecimento, como também, todos seus esforços em desenvolver algo materialmente mais accessível a maioria das pessoas, tanto em nível de leitura quanto em nível de escritura.

É bem verdade que a historia do livro permeia uma trajetória muito longa para ser abordada aqui com riqueza de detalhes, porem, a grosso modo, podemos dizer que o livro, mais precisamente o livro impresso, marca na historia da humanidade uma segregação entre duas épocas distas: a idade Media e a Moderna. O desenvolvimento da prensa de Gutenberg não deve de forma alguma a ele mesmo, mas a uma profunda concentração de desejos, carências e informações culminadas na sua época. O que, basicamente, Gutenberg fez foi associar e organizar tudo isso convergindo para uma nova solução; isso, por volta da segunda metade séc. XV.

La imprenta, es decir, el libro impreso, no nace, pues, por la intuición genial de un hombre, ni siquiera por la conjunción de avances tecnológicos determinados, sino más bien por un proceso de maduración social. Nace a medida que crece el oficio y hasta la simple costumbre de pensar, de trasladar lo pensado a la escritura y de intentar que la escritura se convierta en “texto”, en conocimiento social canónico, y la auctoritas en “autor” libre de otras barreras que no sean las que el propio texto impone. (CATÓN, José M. Fernández. Creadores del Libro p. 32).

Portanto, desde que o livro passou a ser produzido em série; em múltiplos idiomas e, com variados tópicos dissertativos, o livro impresso começou adquirir linguagem própria abrindo dessa forma, uma nova relação paradigmática na sociedade da época de Gutenberg; conhecida como: A sociedade de leitores, devido à crescente democratização da alfabetização.

Com relação à produção impressa dos livros, novos códigos de escritas; tipografias, formatos de letras, estilos e normas de composição foram, paulatinamente, educando os novos leitores sobre como trafegar dentro do texto ou, como melhor aproveitar aqueles momentos de isolamento e independência que haviam conquistado. Nada sobre o livro foi obtido instantaneamente, pelo contrario, como podemos observar tudo foi arduamente criado de acordo com o amadurecimento de cada época, como nos lembra muito convenientemente Mc Arthur:

La estructuración de los libros no tiene nada de “natural”; de hecho, es tremendamente antinatural y necesitó nada menos que 4.000 años para producirse. El gran logro de los escolásticos, sobre todo para las elites escribanas del mundo, fue estilizar los temas, tramas y formas de los libros en una forma realmente rigurosa de estudio, las escrituras y el debate. Sus convenciones acerca de la estructura de los libros cambiaron radicalmente con el advenimiento de la imprenta, que fomentó la ordenación alfabética que nunca antes había cuajado. (MC ARTHUR, apud. Landow. 1995, p. 78)

Entretanto, ainda hoje o livro continua a enfrentar novas modificações de codificação e decodificação, ou seja, o livro como conhecemos tradicionalmente; composto linearmente, vem cada vez sofrendo drásticas influencia de outras formas de mídia as quais oferecem mais agilidade de leitura, profundidade de investigação, maior compressão de informação em menores espaços de armazenamentos sem mencionar as infinitas possibilidades de conexões interdisciplinares, as múltiplas autorias que quebram e descentralização as formas ditatórias dos textos de autor. Desta forma, o livro hoje passa por uma profunda forma de conversão discursiva, estética e filosófica que se ligam e se estendem ao infinito das possibilidades associativas e não “geniais”.


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